Thursday, January 31, 2008

Nelson-ON, Nelsinho-Off

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Breve reflexão: se os três campeões mundiais de Fórmula 1 brasileiros tinham nomes terminados em ON - Emerson, Nelson e Ayrton - aumenta a expectativa de que Nelson Ângelo Piquet siga a mesma escrita.

Então, abadonemos de vez a mania de chamar o novo piloto da Renault de Nelsinho.

Aliás, só pode dar nisso mesmo a tradição de colocar nomes dos progenitores nos filhos. Inho pra cá, inha pra lá. Minha mãe tem o nome da minha avó e sempre destestou que para ela sobrasse o inha...

Wednesday, January 30, 2008

Brakes on

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Responda rápido: para que servem os freios de um veículo? Para fazê-lo parar? Hum... Acho que você precisa ler minha coluna no GPTotal... Lê, vai.

Tuesday, January 29, 2008

Happy birthday, Mr. Blog...

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Nesta terça-feira de tempo escabroso em São Paulo (aliás, e o tal aquecimento global, alguém sabe, alguém viu?), este blog completa dois anos.

Nasceu da instigação de amigos, especialmente os freqüentadores da caixa de comentários do Pedro Alexandre Sanchez, que acabou sendo uma espécie de padrinho deste espaço.

Alessandra Alves, o blog, fala de corrida - de carro e a pé, de futebol, de música, de literatura, do que der na veneta. Fala e ouve, dialoga, que é, no fundo, o mais legal da história.

Vou aproveitar a data para perguntar: o que você mais gosta de ler aqui no blog? Tem saudade de ler alguma coisa que faz tempo que não coloco? Quer sugerir algum tema? Vamos, diga!

Saturday, January 26, 2008

ECA e a estátua de sal

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Tinha tanta fixação em estudar na Universidade de São Paulo que prestei vestibular duas vezes. Uma, ainda no segundo colegial, só para ver como era. E, naquela época, não havia a figura do "treineiro", o estudante sem diploma que tenta a sorte só para ganhar experiência. Prestei para valer, para o curso de História, e passei. No ano seguinte, quando tentaria a sorte em Jornalismo, 45 míseras vagas, fiz nada além de estudar. Meu colégio, de freiras, era rígido como um Ratzinger, exigia média sete, de forma que não me animei a fazer cursinho junto com a escola. Achei que a divisão de esforços só me atrapalharia e decidi arriscar.

No colégio, todo ano, as freiras preparavam um cartaz enorme, escrito à mão, com aquela letra perfeita de professora primária. No conteúdo, os nomes das alunas aprovadas nos vestibulares. Não era incomum encontrar referências à USP naquele rol, o que me animava e, mais ainda, me estimulava. No fundo, eu acho que queria passar na USP principalmente para ver meu nome no cartaz do colégio.

Depois da primeira fase, fiquei tranqüila. Eu havia conseguido pontos suficientes para passar em Medicina, baseada nas notas de corte do ano anterior. Na segunda fase, meu estado de espírito não era o mesmo. As provas, dissertativas, não me davam certeza quanto à interpretação dos avaliadores. Só relaxei mesmo no último dia, depois da prova de redação. Eu senti que tinha acertado o tom, tanto que pedi licença para a professora que nos vigiava para copiar meu texto original em um outro papel, pois quis levar a redação comigo.

Depois das provas da Fuvest, prestei outros três vestibulares, para garantir. Não me lembro quando saíram os resultados. Naquele tempo, não havia internet e era preciso ir conferir as listas na própria USP ou em cursinhos, como o Objetivo, da Paulista. Apesar da ansiedade, não me aventurei em ir até lá. Eu não queria ser vítima de trote, porque sempre tive nojinho dessas misturas de farinha, ovo, tinta e outras melecas. Já não me lembro se alguém viu meu nome e me contou ou se tive o espírito zen de esperar pela publicação no jornal, no dia seguinte.

Faz vinte anos que entrei na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, a ECA/USP. A lembrança me veio à mente num desses sábados, enquanto treinava pelas ruas da Cidade Universitária. Vou à USP todo sábado para correr e nunca - nunca! - mais passei na frente da ECA.

Jovens estudantes, colegas acadêmicos, por favor, não se choquem com minha afirmação mas, de fato, a ECA foi, para mim, como aquela definição de sítio, de buggy ou de barco. Duas alegrias. Uma quando entrei, outra quando saí. Não vou dizer que o ensino era fraco, que os professores eram ruins, que a estrutura era falha. Eu simplesmente não me achei naquele lugar.

Por seu diminuto número de vagas, a ECA era formada pela elite da elite, ou seja, os alunos mais CDFs das melhores escolas. Ou seja, tudo filhinho de papai, inclusive eu. Então, ficava tudo muito sem nexo, para mim, ver aquele monte de boyzinhos, de Escort XR3 e Gol GTS na porta, discutindo os rumos da revolução lá dentro. Pior era a dinâmica do curso. Eu tinha prestado Jornalismo para exercitar minha escrita, aprender a fazer rádio e TV, e só me via às voltas com textos impenetráveis, que deveria ler à exaustão, e o fazia, porque não deixei de ser CDF, embora me sentisse mastigando areia a cada página devorada.

Fui aluna de professores excelentes, gente que dedicou a vida à carreira acadêmica e sabia, de fato, muito sobre comunicação social. Eu admirava, e admiro, a devoção daqueles profissionais ao estudo detalhado da lingüística, da sociologia, da antropologia, da lógica, mas não conseguia me excitar com a idéia de passar um semestre, ou vários, tentando decifrar seus textos com vocação para esfinge. Hoje, admito, aquela areia duramente mastigada deve ter contribuído para a argamassa do meu conhecimento, mas como era duro, na época...

Tive dois ou três amigos na turma. Um deles talvez seja meu amigo mais íntimo até hoje, apesar de morar muito distante de mim. Os demais, gente que nunca me fez nada, sumiram na poeira do meu tempo, como eu na vaga lembrança deles. Na São Silvestre de 2006, enquanto corria pela Paulista, de repente divisei um ex-professor na multidão, assistindo à nossa passagem. Nossa, que incrível, pensei. Nunca mais vi esse cara, e de repente vejo-o na multidão, tão fora de contexto.

Findo o quarto ano, fui até a secretaria da escola para saber o que deveria fazer para pegar, e logo, o meu diploma. Informaram-me que tudo seria automático, após a colação de grau. Por mim, nem iria à tal cerimônia, mas a secretária me aconselhou a fazê-lo, porque eu precisava colar grau. Era regimento, burocracia, tinha que ir. Fui, sem fazer grande alarde na família. Mera formalidade. Peguei o diploma e nunca mais voltei à ECA, sem passar em frente nem em meus treinos semanais. Não acho que tenha me traumatizado, eu só não gostei de passar quatro anos lá. Por via das dúvidas, acho que vou continuar distante. De repente, numa olhadela à toa, ainda acabo virando uma estátua de sal.

Friday, January 18, 2008

Do mestre, com carinho



Há alguns anos, depois de ler o livro "Noites Tropicais", espécie de auto-biografia do jornalista, letrista, crítico e produtor musical Nelson Motta, tive uma atitude ousada. Escrevi para meu mestre e amigo Zuza Homem de Mello e perguntei se ele não gostaria de ditar suas memórias de crítico, produtor e historiador musical para mim. Foi mais que ousadia, um atrevimento. Mas, para quem já havia escrito para o Zuza aos treze anos, enviando a ele um roteiro de programa de rádio, não havia risco a ser calculado. Ainda mais porque, naquele já distante 1983, ousado foi ele, que colocou meu programa no ar. Essa história, inteira, está aqui.

A resposta do Zuza à minha instigação veio com a lógica esperada, revestida de toda a elegância que sempre o acompanhou. Disse que ficava agradecido, mas que não tinha como aceitar, pois ele mesmo escrevia livros, sendo autor de vários títulos já publicados, que eu aliás havia lido. E disse mais: que já tinha começado a escrever suas memórias e que me avisaria sobre o lançamento. Assim falou, assim o fez. Em setembro, fui encontrá-lo na noite de autógrafos do livro "Música nas Veias", que aconteceu na Livraria Cultura, no Conjunto Nacional.

No e-mail que escreveu para mim, meses antes do lançamento, Zuza adiantava o teor de um dos capítulos - sua experiência como apresentador do "Programa do Zuza", atração diária da rádio Jovem Pan que influenciou diretamente minha escolha profissional. Fiquei ansiosa para ler esta passagem, e mais ainda quando, durante o lançamento, Zuza me chamou a atenção para o fato de que eu estava citada no livro. Eu, no livro de memórias de Zuza Homem de Mello, que troféu!

Li o capítulo 5 - "O poder da voz" - assim que cheguei em casa, emocionada por relembrar aqueles dez anos de programa, que acompanhei como ouvinte desde os sete anos de idade e que começava com a seguinte vinheta: "Aí vem o Zuza, um programa para quem tem música nas veias". E feliz, orgulhosa mesmo, pela menção ao meu nome, pela dedicatória tão carinhosa que o mestre escreveu para mim.



Mas a vida é tão corrida que só consegui ler o livro inteiro no final do ano. Zuza intercala passagens de sua própria vida como estudante de música, produtor musical, radialista e crítico de música com estudos de fôlego sobre temas pouco abordados na literatura brasileira dedicada à música. Um dos capítulos mais impressionantes é "Aceita dançar?", uma radiografia minuciosa de todas as principais orquestras de baile do Brasil desde o início do século 20. Zuza iniciou a pesquisa para este ensaio ainda na década de 1970 e chegou ao requinte de listar todos - todos! - os músicos que fizeram parte desses grupos.

Entre os ensaios, o que me tocou mais de perto foi "Swing Heil!", um encantador retrato da Berlim pré-Segunda Guerra, com a influência fortíssima de músicos de jazz no cenário sócio-cultural da cosmopolita cidade, e de como a perseguição a negros e judeus minou essa efervescência musical.

Não nego, no entanto, minha preferência pelos capítulos dedicados às memórias do Mestre Zuza. Suas aventuras na Nova York dos anos 1950, sua diligência no contato com estrelas musicais de vários países, atrações da TV Record nos anos 1960, sua maneira coloquial e fluida de contar histórias.

Para quem tem música nas veias, um documento obrigatório. Só é pena que, pelas páginas do livro, não seja possível ler as histórias e ouvir a marca registrada do Zuza radialista que tanta companhia me fez na infância e na adolescência: sua contagiante gargalhada.

Ao terminar "Música nas veias", uma imensa vontade de agradecer ao Mestre, que mais uma vez, generosamente, veio me ensinar um pouco de seu enorme conhecimento musical.

Wednesday, January 16, 2008

1968, o ano que terminou... em abril

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Há quarenta anos, o mundo foi sacudido pelos acontecimentos de 1968, conhecido como "o ano que não terminou". Na Fórmula 1, não foi bem assim. Quer ver? Minha coluna no GPTotal fala sobre o tema. Vai lá, vai...

Thursday, January 10, 2008

Tô voltando...

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Pode ir armando o coreto
E preparando aquele feijão preto
Eu tô voltando
Põe meia dúzia de Brahma pra gelar
Muda a roupa de cama
Eu tô voltando

Leva o chinelo pra sala de jantar
Que é lá mesmo que a mala eu vou largar
Quero te abraçar, pode se perfumar
Porque eu tô voltando

Dá uma geral, faz um bom defumador
Enche a casa de flor
Que eu tô voltando
Pega uma praia, aproveita, tá calor
Vai pegando uma cor
Que eu tô voltando

Faz um cabelo bonito pra eu notar
Que eu só quero mesmo é despentear
Quero te agarrar
Pode se preparar porque eu tô voltando
Põe pra tocar na vitrola aquele som
Estréia uma camisola
Eu tô voltando

Dá folga pra empregada
Manda a criançada pra casa da avó
Que eu to voltando
Diz que eu só volto amanhã se alguém chamar
Telefone não deixa nem tocar
Quero lá, lá, lá, ia, porque eu to voltando!

(Mauricio Tapajós - Paulo César Pinheiro)

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Quando Simone gravou essa música, no final dos anos 1970, eu a entendia apenas como um cara que estava voltando para casa, doido para matar as saudades da patroa depois de alguma viagem de trabalho. Só muitos anos depois fui entender que havia ali um componente político, festejando a tão aguardada anistia aos presos políticos da ditadura militar.

Depois da São Silvestre, de uma semana na praia, de distância quase total de computador, notícia, e-mail, corrida (a pé ou de carro), de sentir falta de asfalto, da Paulista, e da minha eterna animosidade com aquela entidade conhecida como areia, que se espalha, impregna tudo, entra pelos poros etc. etc., estou voltando.

Pedindo um tempinho para poder responder aos últimos comentários, para postar fotos da São Silvestre, para ir aquecendo novos temas para o debate. Agradecendo desde já pelos votos de feliz 2008 e pelas mensagens carinhosas.

Tô voltando...

Tuesday, January 01, 2008

São Silvestre, Ano 2

Tudo diferente, tudo tão igual. O lado bom de fazer uma mesma corrida pela segunda vez é ter parâmetros para comparar. O lado ruim é antever os pontos críticos e domar a ansiedade por superá-los. Há ainda um terceiro ponto – o imponderável, que faz com que uma corrida seja ao mesmo tempo tão diferente e tão semelhante à prova disputada no ano anterior.

São Silvestre 2006 x São Silvestre 2007, as diferenças.

Solidão, que nada...

A primeira – e talvez mais marcante: não estou só. No ano passado, correr a São Silvestre foi, sobretudo, um grande exercício de solidão. Fui sozinha para a região da Paulista, deixei meu carro no prédio do escritório, caminhei sozinha até a largada, alonguei e aqueci sem trocar palavra com ninguém, pois não conhecia nenhuma das mil e poucas mulheres que dividiam o espaço da avenida comigo.

Corri sozinha, literalmente sozinha em alguns trechos, pois a prova feminina tinha proporcionalmente tão poucas atletas que era comum olhar à volta e não ver ninguém ao meu lado. No ano passado, aqui mesmo no blog, escrevi este trecho: No fim do Minhocão, sem prédios ao redor, um silêncio solitário, quase triste.

Ontem, nada de solidão. Parte da equipe Conexão participou da prova e combinamos de nos encontrar antes da largada. Em uma paralela da Paulista, no lugar marcado, lá estávamos: Henry, Zoca, eu, Fábio, Lara, Ammar (com dois amigos), além do Marcio, namorado da Lara que mora ali pertinho. Fomos até o prédio dele e lá nos alongamos, tentando lembrar a seqüência de exercícios que nosso técnico Zé nos passa. Zé está em férias, não pôde nos acompanhar. E nenhum de nós levou câmera fotográfica, até porque ninguém quer segurar máquina e correr a São Silvestre ao mesmo tempo.

Gente, muita gente

A organização da prova, desta vez, dividiu a largada em trechos determinados pelo ritmo dos corredores. À frente, deveriam ficar os que correm cada quilômetro em 4min30. Logo atrás, quem faz o mesmo trecho com tempo de 5min, e assim sucessivamente. Bem, valeu a tentativa, mas a São Silvestre não é uma corrida como outra qualquer. Há quem chegue lá antes do meio-dia só para largar na frente, ainda que tenha tempos miseráveis.

E o povo vai chegando e se acomodando, alguns vestindo fantasias, carregando faixas ou imagens de santos, e poucos pareciam se importar com os banners que indicavam o ritmo ideal para aquela localização na largada. O início estava marcado para as 16h45. Nosso encontro, antes do alongamento, foi às 16h. Ou seja, chegamos à largada quando faltava menos de meia hora. Nesse panorama, simplesmente, era tentar se acomodar no meio da multidão, sem chance de localizar o trecho ideal. Se, no ano passado, eu achei a prova vazia, ontem eu soube o que é gente, muita gente.

Outra diferença: o horário. Em 2006, a prova feminina largou às 15h15. Teoricamente, um horário mais sacrificado, em função do calor. No entanto, a prova do ano passado foi disputada com tempo bem mais ameno que ontem. Além de tudo, choveu à beça em 2006. Ontem, apesar de largar mais tarde, o calor estava muito, mas muito mais forte, e não choveu. Pelo menor número de inscritas e pela chuva, senti saudade da prova de 2006.

Vinte mil atletas, homens e mulheres misturados, aquele famoso mar de gente. Claro que, diante desse quadro, não dá para correr em ritmo forte no início da prova. Do momento da largada até passar pelo tapete que registra a passagem de cada corredor, levamos mais de nove minutos. Até aí, sem problema, pois o tempo não é registrado enquanto não se passa pelo tapete. A encrenca começa na passagem, quando o tempo já está sendo registrado e a muvuca ainda é imensa ao redor. Se, em 2006, eu já estava livre e solta no final da Paulista, com pista livre à minha frente, desta vez só consegui ter um pouco mais de espaço – pasmem! – no viaduto da avenida Pacaembu, ao lado do Memorial da América Latina, portanto, depois do quilômetro sete e meio. Portanto, com mais de metade da prova cumprida.

Calor de sauna a vapor

Se, psicologicamente, a ausência de solidão foi a maior diferença entre 2006 e 2007, fisicamente o contraste se deu na temperatura. Especificamente, em um trecho da corrida, o final do Minhocão. Foi ali, no ano passado, que senti quase um deserto de concreto à minha volta, unindo-se ao cinza das nuvens que não tardariam a desaguar. No texto de 2006, escrevi: E as nuvens de um negrume renitente. O dia ficou noite. Quando virei no Largo Padre Péricles, ela chegou. Grossa e quente, uma chuva-benção.

Pois ontem, foi exatamente ali que senti toda a diferença. Um mar de cabeças à minha frente, um sol pra cada um, o ar abafado, parecendo se adensar à nossa volta, qual névoa quente de uma sauna a vapor. Meu recorde de dezembro, fazendo 10 km em 49min cravados, naturalmente já tinha ido pro vinagre. Condições diferentes, claro. Mais quente, muito mais gente, e sem o estímulo do “grilo falante” que me empurrou na prova anterior.

Mesmo com essa ausência, lembrei muito das orientações do técnico Zé Eduardo e do colega Henry, que puxou meu ritmo na prova do recorde. Esquecer um pouco o relógio, aumentar o ritmo quando tivesse oportunidade, reduzir quando me sentisse ofegante, inclinar um pouco o tronco para frente nas subidas, beber pouca água durante a prova. Com meia corrida a superar, e bem acima da minha melhor marca, procurei me concentrar em aumentar o ritmo o quanto fosse possível, aproveitando a pista um pouco menos lotada, e tentar melhorar o tempo do ano anterior.

São Silvestre 2006 x São Silvestre 2007, as semelhanças.


<<< Em casa, antes de sair para a prova

Adrenalina e emoção

Isso já deu para perceber que é sempre igual. Correr a São Silvestre é diferente de fazer qualquer outra prova. Há corridas que ocupam lugares especiais no meu coração – a prova do Barro Branco, a do Centro Histórico, a do Ipiranga – por motivos diversos. Em todas, fico ansiosa pela largada, obstinada pelo resultado, ou seja, com a adrenalina alteradíssima. Na São Silvestre, há tudo isso, mas um componente especial: a emoção. Indo para a Paulista, acho que me sinto mais emocionada que “adrenada”.

Fazer o percurso a pé, entre o prédio do escritório e a avenida, cruzar com outros competidores, trocar sorrisos e leves acenos de cabeça, como se fôssemos todos membros de uma irmandade são hábitos prosaicos que reforçam minha alegria por estar ali. Ontem, quando encontrei a turma, comentei esse sentimento com alguns deles e vi que não estou só. Depois da largada, com foco total na corrida, com o sacrifício imposto pelo percurso e pelo calor, a emoção fica dormindo em algum desvão da mente.

Mas é só virar a Brigadeiro e entrar na Paulista que ela dá as caras. Com pouca gente ou cercada pela multidão, às quatro e meia da tarde ou às seis, já percebi – é sempre reconfortante voltar à Paulista e terminar a São Silvestre, é sempre um convite a agradecer pela vida, pela saúde, por mais um ano, por mais uma corrida. Nessa hora, cumprimenta-se quem está ao lado, seja quem for. A vontade de compartilhar é imensa e, afinal, somos todos ali, de fato, todos da mesma irmandade. Da Paulista, vamos para festas familiares ou baladas, cada um escolhe seu programa. Mas tenho a impressão de que a apoteose de Réveillon, para o corredor, é cruzar a linha de chegada da São Silvestre.

Loucuras de uma tarde de verão

Coloque quarenta mil pernas pelas ruas do centro de São Paulo, em um final de tarde de calor, e as histórias só poderão mesmo se multiplicar. Algumas curiosas, outras tristes, a maioria, inusitada. Triste deve ter sido para a moça que caiu ao nosso lado na descida da Consolação. Estávamos, eu e o Fábio, na pista da esquerda, quando a coitada tropeçou e foi ao chão. Logo alguns colegas se apressaram em ajudá-la, seguimos adiante, sem saber se ela conseguiu fazer o mesmo.

Um pouco mais à frente, um grupo de corredores-animadores arrancava gritos da platéia. Vestidos com roupas de super heróis (imaginem o calor!), carregavam uma bandeira do Corinthians, sendo aplaudidos por muitos e vaiados por outros tantos. Nas ruas da Barra Funda, a velha solidariedade dos moradores. Mulheres com mangueiras refrescavam os atletas. Alguns, exauridos, lançavam-se sôfregos a beber diretamente do jato. Fico pensando se aquela água estava um pouco menos quente que a servida aos atletas pela organização. No terceiro posto de água, radicalizei. Em vez de pegar um copinho, me apossei de um pequeno bloco de gelo. Lógico que não era água filtrada mas, que se dane...

Na avenida Rio Branco, uma atração à parte. Um atleta corria com seu cachorro. E sem coleira! O animalzinho era uma flecha, magrinho feito um queniano, alvi-negro como um sofredor, mas se distraía com os acenos da multidão e com os salgadinhos jogados no chão pelas crianças. O totó mordia a isca, e lá vinha o dono, de volta pela avenida, para colocar o cachorro novamente na rota.

Brigadeiro who?

Apesar de ter disputado apenas duas vezes a São Silvestre, já fiz o percurso três vezes, pois há alguns dias a equipe fez um treino de reconhecimento, no domingo pela manhã. Quanto mais corro nesse trajeto, mais me convenço de que a tal “subida da Brigadeiro” é muito mais mito que desafio. Sim, sobe, muito, mas não é o pior trecho da prova.

A São Silvestre é uma corrida dificílima, cruel em um sentido: desce praticamente tudo o que tem de descer na primeira metade da prova, deixando o trecho final com a tarefa de escalar novamente o morro. Quando se chega na Brigadeiro, faltam cerca de dois quilômetros para o fim da prova. A subida é precedida de uma forte descida, no viaduto que leva o mesmo nome, e de um trecho quase plano. Os últimos metros da Brigadeiro também já são quase planos. Sobe, sobe bem, mas antes disso já se subiu muito também, como no viaduto do Memorial, no impiedoso viaduto que liga as avenidas Rudge e Rio Branco, na própria Rio Branco e no curto, porém sacrificante Largo São Francisco.

A Brigadeiro tem, a seu favor, um componente psicológico fundamental. “Quem chegou até aqui, agora vai até o final”. É um turbo poderoso esse pensamento, tanto que, mesmo depois de subir a ladeira, quase todo mundo consegue dar seu sprint final na Paulista.

E não é que estou subindo a decantada Brigadeiro quando me vejo atrás de dois atletas de Cerquilho?! Atletas de Cerquilho são quase um patrimônio da São Silvestre. Estão sempre lá, com camisetas e/ou faixas. Mesmo subindo, não resisti ao gracejo: “Ê, Cerquilho, agora minha corrida ficou completa!” O colega, que nunca vi mais sarado, responde orgulhoso: “É isso aí, e esse ano trouxe meu filho junto!”. Daí, me animei: “Você conhece Gê Tock, lá de Tietê?” Conhecia, claro. Quem não conhece meu amigo Gê Tock, de Tietê? Quinze quilômetros, quarenta mil pernas. E eu encontro o amigo do amigo...

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Ao fim e ao cabo, não consegui melhorar o tempo do ano passado. Em 2006, fiz em 1h22min53. Este ano, completei em 1h23min15 (384ª na categoria feminina, 63ª na minha faixa etária). Em um primeiro momento, achei que tinha conseguido fazer em 1h20, mas meu cronômetro zerou em um dos postos de água e tive de recomeçar a contagem. Devo ter perdido o fio da meada, mas não estou frustrada, principalmente pelo calor e pelo número de inscritos. No ano passado, a prova feminina teve 1.327 inscritas. Este ano, corri junto com outras 20 mil pessoas.

Assim que tiver mais fotos, daquelas que são publicadas pelos sites especializados, prometo postar aqui.

Agora, sim, vou me despedir para minhas férias. A blogueira tira uma semana a partir do dia 2, retornando às atividades bloguísticas na segunda quinzena de janeiro.

Obrigada pelos votos de boa sorte, pela companhia e feliz 2008 a todos vocês!